Stela do Patrocínio (1941-1997)
Stela do Patrocínio
(1941-1997) foi uma poeta negra e pobre abandonada pela família na Colônia
Juliana Moreira, manicômio onde passou os últimos trinta anos de sua vida. A
poesia escapa ao campo do reconhecimento, toca outro ritmo, dança outras
significâncias. A poesia é a loucura dos deuses.
*
* *
eu já fui operada
várias vezes
fiz várias operações
sou toda operada
operei o cérebro,
principalmente
eu pensei que ia
acusar
se eu tenho alguma
coisa no cérebro
não, acusou que eu
tenho cérebro
um aparelho que pensa
bem pensado
que pensa positivo
e que é ligado a
outro que não pensa
que não é capaz de
pensar nada e nem trabalhar
eles arrancaram o que
está pensando
e o que está sem
pensar
e foram examinar esse
aparelho de pensar e não pensar
ligados um ao outro
na minha cabeça, no meu cérebro
estudar fora da
cabeça
funcionar em cima da
mesa
eles estudando fora
da minha cabeça
eu já estou nesse
ponto de estudo, de categoria
*
* *
Eu não tenho cabeça
boa não
Não sei o que tem aqui dentro
Não sei o que tem aqui dentro
Não sei o que tem aqui dentro
Não sei o que tem aqui dentro
Não sei o que tem aqui dentro
Não sei o que tem aqui dentro
Eu sei que tem olho
Mas olho pra fazer enxergar como?
Mas olho pra fazer enxergar como?
Quem bota pra
enxergar
se não sou eu que boto pra enxergar?
se não sou eu que boto pra enxergar?
Eu acho que é ninguém
Enxerga sozinho
Ele se enxerga sozinho
Enxerga sozinho
Ele se enxerga sozinho
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