Claudia Roquette-Pinto

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Canção de Molly Bloom

 “O coração dele batia como louco
 e sim, eu disse sim”
 ao mar carmesim enrodilhando
 o meu corpo, às vezes como fogo
 às vezes vertigem;
 no abraço torto
 um tronco atado ao outro
 à beira do precipício,
prestes a cair.
Presteza, as nossas bocas
 (até ali estrangeiras)
 instruindo uma à outra
 na mesma velocidade (de raio,
 de alcateia) dos corpos enquanto ensaiam
 o reconhecimento
 debaixo do tombo dos ventos e atravessados de luz.
 E “como ele me beijou
 contra a muralha mourisca”
 (que ali não existia,
 mas quase rima com a lemniscata
 de ímã que então se riscava
à volta do meu,
 do seu coração)
 “E sim eu disse sim eu
 quero sim” (ainda que muda)
 e depois do lampejo de silêncio
 (eu estava certa)
 a sua voz
 toda aberta para mim.


In  Margem de manobra.  Rio de Janeiro: Aeroplano, 2005, p. 61).

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