Peso vivo

Paul Klee



















Peso vivo

Abro a porta,
a maçaneta fica na mão.
Sempre fico na mão.
O cheiro de cigarro barato
clareia o corredor às escuras.
Nenhuma correspondência
na caixa de correio,
sepulcro de ausências,
só folhetos de outra vida
e de pizzas em promoção.
A calça quase caindo.
O fio do interfone pendurado
em gritos agônicos
me avisa que o fim está próximo.
Passo pelo jardim
infestado de gatos em pânico
e arbustos quase mortos.
Do muro do condomínio
miro o assalto no ponto de ônibus,
só então posso tentar a sorte
sob o céu de pipas inclementes.
Pocket de Rimbaud no bolso.
Não tenho aonde ir.
Não posso voltar.
Não posso ficar.

Subo a passarela sobre a linha
do trem
que nunca irá passar.
(você
tão veloz
passagem em branco).

A vida tá pesada demais,
a cada passo
cai uma montanha em minha cabeça
onde caiu outra montanha
por cima de outra
outra
outra
outra.


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