Antonio Machado
















Belo dia de primavera, a chave do reino entregue à Besta. Sim, belo dia para morrer. Antonio Machado e dizer que, mesmo com a corda no pescoço, alguém resiste abaixo das nuvens no exato momento em que algo parece deixar a vida suspensa no ar. Do lixão da cidade, da mais remota periferia, do acampamento onde dois corpos se estendem, da memória em ruínas do Estácio, do terreno de quilombolas às voltas com mortos-vivos, das aldeias de índios tratorados na mata, do amor que perdi em algum baile,  das peladas de pés descalços em Morro Agudo também se avista o esplendor do céu.

Arte poética

Há em toda alma uma festa somente,
tu vais sabê-lo, Amor, sombra florida,
sonho de aroma, e logo ... nada;  andrajos,
rancor, filosofia.
Roto no espelho o teu melhor idílio,
e de costas voltadas já à vida,
será tua oração cada manhã:
Para ser enforcado, belo dia!

Arte poética

Y en toda el alma hay una sola fiesta,
tú lo sabrás, Amor, sombra florida,
sueño de aroma, y luego ... nada; andrajos,
rancor, filosofía.
Roto en tu espejo tu mejor idilio,
y vuelto ya de espaldas a la vida,
ha de ser tu oración de la mañana:
¡Oh, para ser ahorcado, hermoso dia!

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