Murilo Mendes

 


Um poema de Murilo Mendes. Murile-se.

A criação e o criador

O poema obscuro dorme na pedra.

"Levanta-te, toma essência, corpo".

Imediatamente o poema corre na areia,
Sacode os pés onde já nascem asas,
Volta coberto com a espuma do oceano.

O poema entrando na cidade
É tentado e socorrido por um demônio,
Abraça-se ao busto de Altair,
Recebe contrastes do mundo inteiro,
Ouve a secreta sinfonia
Em combinação com o céu e os peixes.

E agora é ele quem me persegue
Ora branco, ora azul, ora negro,
É ele quem empunha o chicote
Até que o verbo da noite
O faça voltar domado
Ao pó de onde proveio.

In As metamorfoses. Rio de Janeiro: Record, 2002.p.75. 

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